Estudos têm apontado os jovens como os mais afetados por câncer de boca e garganta, até pouco tempo atrás associados a pacientes com mais de 50 anos e histórico de consumo pesado de álcool e tabaco.

A mudança no perfil dos afetados pelo papiloma vírus humano (HPV) tem grandes implicações nos programas de prevenção, detecção precoce e também no tratamento da doença.

O tema foi abordado pelo médico Luiz Paulo Kowalski, diretor do Departamento de Cirurgia de Cabeça e Pescoço e Otorrinolaringologia do Hospital A.C. Camargo, durante o evento "Fronteras de la Ciencia – Brasil y España en los 50 años de la FAPESP.

O simpósio integra as comemorações dos 50 anos da FAPESP e reúne, nas cidades de Salamanca (10 a 12/12) e Madri (13 e 14/12), pesquisadores do Estado de São Paulo e de diferentes instituições de ensino e pesquisa do país ibérico, em uma programação intensa, diversificada e aberta ao público.

"Levantamentos anteriores feitos no Brasil apontavam uma prevalência de infecção pelo HPV menor que 2% nos pacientes com câncer de cabeça e pescoço. Mas um estudo nosso publicado em 2012 mostra que em pacientes jovens com tumores de boca a prevalência é de 32%. Isso é bem alto", contou Kowalski à Agência FAPESP.

Para o estudo, foram comparadas 47 amostras de tumores de pacientes com menos de 47 anos e 60 amostras de pacientes com mais de 50 anos. Entre os mais velhos o índice de infecção foi de 8%. "Nos dois grupos, o estágio da doença era parecido, a localização do tumor era semelhante e, ainda assim, os pacientes jovens HPV positivos tinham taxa de sobrevida melhor que os demais", contou Kowalski.

Esse achado reforça dados de estudos anteriores que apontam um melhor prognóstico para pacientes HPV positivos. "Parece ser um tumor diferente, com comportamento mais localizado e menos agressivo. Em geral, os pacientes respondem melhor ao tratamento", disse.

Em outro estudo que está em andamento, estão sendo comparados 23 pacientes com câncer de amígdala atendidos no Hospital A.C. Camargo com 10 pacientes atendidos no Hospital do Câncer de Barretos, no interior de São Paulo.

O objetivo é identificar marcadores de resposta ao tratamento, mas ao fazer a avaliação da presença do HPV os pesquisadores encontraram um dado interessante: enquanto 78% dos pacientes da capital são positivos para a presença do vírus, todos os voluntários de Barretos foram negativos.

"Provavelmente essa diferença se deve ao fato de que na capital as pessoas aderiram mais às campanhas antifumo e hoje bebem menos do que antigamente. Já no interior, os hábitos mudaram menos. Além disso, o comportamento sexual na capital também está mais diferente e isso é um dos fatores aos quais se atribui o aumento da ocorrência dos casos de câncer associados ao HPV", explicou Kowalski.

A pesquisa está sendo realizada no âmbito do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Oncogenômica do Hospital A.C. Camargo, um dos Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia (INCT) apoiados pela FAPESP e pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

Mudança de paradigma

O panorama para um jovem com esse tipo de câncer há 20 anos era muito ruim. Já hoje, pacientes HPV positivos, sem histórico de consumo pesado de álcool e cigarros, têm grande chance de se curar da doença e voltar à vida normal.

Para Kowalski, essa mudança no perfil dos acometidos pela doença exige a revisão dos programas de prevenção e detecção precoce da doença, focado em cuidados com a boca em pacientes fumantes. "Agora temos de nos preocupar com todas as pessoas. Mesmo quem não fuma e não bebe pode estar em risco", disse.

"Embora existam mais de 200 variações de HPV, a maioria dos casos de câncer de orofaringe está associada aos tipos 16 e 18, contra os quais a vacina é capaz de proteger. É a melhor forma de prevenir a doença no futuro", destacou Kowalski.

 

 

Fonte: Agência FAPESP

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